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Coemergência


A palavra tibetana lentchig kyepa é traduzida como "coemergência" ou "se reunindo", igual à fusão de dois rios. Também poderia ser traduzido como "inato", porque literalmente significa "nascido juntos". Coemergência se refere ao fato que a sabedoria que percebe a natureza verdadeira dos fenômenos já está presente em nós. Não é alguma coisa que precisa ser gerada novamente. Nós temos essa sabedoria, mas não percebemos isso. Por não ter percebido as coisas tal como elas são, ou mahamudra, nós sofremos. Pela sabedoria coemergente, nós nos conectamos com a realidade das coisas que já estão presente em nós.


A Terminologia da coemergência


Quando falamos sobre coemergência, não estamos falando de outra coisa que não seja a verdadeira natureza da mente. Assim, coemergência significa a clara luz que é igual ao espaço, e que é o soberano de todo o samsara e nirvana. Quando falamos sobre coemergência, estamos falando sobre a inseparabilidade da vacuidade e luminosidade. Quando pessoas comuns iguais a nós entende alguma coisa de vacuidade da mente, nós não entendemos sua luminosidade e, quando entendemos alguma coisa sobre luminosidade da mente, não compreendemos sua vacuidade. Mas, de fato, a vacuidade e luminosidade da mente estão completamente integradas. A vacuidade da mente não é uma vacuidade que nega a luminosidade -- isso é, a total falta de solidez da mente. E a luminosidade da mente não solidifica sua capacidade de conhecer. Vacuidade e luminosidade não são contraditórias em modo algum. Elas são coemergente.


O que é que emerge junto? São os fenômenos (sânsc. dharma) e sua essência, ou realidade (sânsc. dharmata). Nós podemos explicar isso dizendo que há fenômenos, que inclui coisas que são estáveis e coisas que se movem, e ao mesmo tempo, há realidade. Assim é como experimentamos as coisas. Outro modo para descrever isso é dizer que há a aparência do fenômeno, e o mesmo tempo, há a sua verdadeira natureza, a qual é vacuidade. Nós tendemos a lidar com as aparências, ou fenômenos, como sendo externos a nós, como tendo uma natureza inerente e como sendo coisas reais. Mas o surgimento das coisas e sua mesmidade -- sua realidade, sua vacuidade -- não é sequencial na forma de ocorrer um e depois outro. Não é o caso, por exemplo, que as coisas, primeiro venham existir e depois se tornam vacuidade. Mas sim que, o surgimento das coisas e sua vacuidade são simultâneos. Nem é o caso que, de alguma forma, nós fazemos essa coemergência e essa vacuidade vir a existir quando meditamos. Apenas que normalmente nós não reconhecemos a coemergência, que é a natureza da mente e a natureza dos fenômenos. Pela meditação, nós começamos a entender isso.


Tipos de Coemergência


Há vários tipos de sabedoria coemergente. Nos ensinamentos do Buddha nos sutras, e dos siddhas nos tratados, a sabedoria coemergente é dividida em base, caminho e fruição.


Sabedoria coemergente da base é a realidade da luminosidade e vacuidade; é a mente na sua natureza básica. Essa sabedoria existe dentro de nós desde o começo dos tempos, mas nós não percebemos isso. Assim, precisamos ouvir os ensinamentos do guru, refletir no que foi ouvido e meditar naquilo que entendemos.


Sabedoria coemergente do caminho é quando sabedoria coemergente nasce dentro de nós. Tornamos-nos acostumados com a sabedoria coemergente e a familiaridade com ela aumenta mais e mais. No final todas as máculas adventícias, que são elementos não inerentes à mente, são eliminadas e todas as boas qualidades afloram completamente. Nesse ponto, nós atingimos o siddhi supremo, ou iluminação, que é a sabedoria coemergente da fruição.


Dois tipos adicionais de sabedoria coemergente são descritos nos tantras vajrayana. O quarto tipo surge através das práticas contemplativas que envolvem a manipulação dos ventos sutis e trabalho com os canais e gotas sutis. A união da bem aventurança e vacuidade é o quinto tipo de sabedoria coemergente.


Mais ainda, os grandes mestres da linhagem Kagyu deram explicações sobre coemergência baseados em suas próprias experiências.


As Instruções de Gampopa


Enquanto as apresentações da sabedoria coemergente nos tantras e tratados são bastante claras, elas não são acompanhadas com as instruções quintessenciais. Dessa forma é de grande ajuda procurar as instruções quintessenciais dadas por Gampopa, que descreve a coemergência e a prática da meditação.


Gampopa descreveu dois tipos de coemergência; mente coemergente e aparências coemergentes. Mente coemergente se refere ao ponto de realização quando shamata e vipashyana se integraram e nós percebemos a mente como ela é -- vazia, luminosa e livre de complexidade. Nós então repousamos nesta essência verdadeira da mente. Porém, a mente tem uma fonte de recursos, ou poder, que não cessa. Essa fonte de recursos surge como aparências variadas. Devido a essas aparências não terem ido além da natureza da mente, elas são chamadas de aparências coemergente. Dessa forma nós combinamos as instruções em coemergência com a prática da meditação.


Três Tipos de Coemergência de Gomchung


Para ajudar os estudantes a entenderem suas experiências, Gomchung, discípulo de Gampopa, expandiu a terminologia de Gampopa. Gomchung indicou que nós temos muitos tipos diferentes de pensamentos e emoções tais como alegria e paixão. Nós podemos pensar neles como sendo bons ou maus, mas todos eles não são nada mais do que a própria mente. Nada mais são do que luminosidade e não tem natureza independente por eles mesmo.


Gomchung descreveu três tipos de coemergência; mente coemergente em si, que poderia ser considerada como o dharmakaya; aparência coemergente, que poderia ser considerada metaforicamante como a luz do dharmakaya; e pensamento coemergente, que poderia ser considerada como as ondas do dharmakaya -- assim como as ondas do oceano não estão separadas do oceano em si, também os pensamentos não são separados da mente em si. Então, enquanto os tantras e os shastras falam de coemergência como a base, o caminho e a fruição, as instruções quintessenciais falam de coemergência como mente em si, como aparência e como pensamento.


Então, na instrução sobre mahamudra, coemergência é chamada coemergência unificada. O que isso significa? Há três elementos; mente (o qual significa simplesmente nossa mente), pensamento (mente que se tornou confusa, agitada e grosseira) e dharmakaya (a sabedoria que percebe as coisas como elas realmente são). Originalmente esses três estavam juntos; subsequentemente eles aparecem para nós como separados; finalmente, pela confiança nas instruções orais sobre mahamudra dadas por um mestre, eles são unificados --apenas mente-- outra vez. Mahamudra é o método que nos habilita a percebê-los como existindo juntos, como coemergente. Assim a instrução do mahamudra é referida como "a instrução que une esses três elementos".


Gomchung afirmou mais ainda que, a mente coemergente é o verdadeiro dharmakaya. Isso significa que o modo de ser da mente --como a união de luminosidade e vacuidade-- nunca foi, desde o começo, constituído. O verdadeiro dharmakaya é a integração de luminosidade/vacuidade da mente, quando percebida na experiência do iogue ou ioguini.


Uma vez que esse dharmakaya foi percebido, então algo a mais pode ser entendido. Gomchung afirmou, "A coemergência da aparência é a luz do dharmakaya". Em outras palavras, coisas variadas surgem, mas porque agora as entendemos como sendo uma integração ou união da luminosidade e vacuidade, nós não cremos nelas como sendo reais. Mais ainda, nós entendemos que elas não têm natureza em si, e nessa base desenvolvemos a sabedoria do dharmakaya.



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